segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Fixação e aferição de metas — a necessidade de uma preparação continuativa para os concursos.


Um dos aspectos mais importantes do processo de preparação para um concurso público é a fixação de uma meta específica, relativamente aos objetivos que o candidato persegue. O concurso para carreiras jurídicas é hoje uma alternativa importante na colocação no mercado de trabalho, sobretudo pelo excesso de oferta de mão-de-obra na área da advocacia, motivada por uma remuneração destacada e vantagens institucionais não encontradas facilmente no mercado privado, além, é claro, do status que representa o exercício de uma função desse porte. Talvez por essas razões vemos diversos candidatos prestando qualquer tipo de concurso para carreiras jurídicas — Ministério Público do Trabalho, Estadual ou Federal; Magistratura Estadual, Federal ou do Trabalho.

É certo que não há nenhum óbice para que assim se proceda, mas esse procedimento tende a causarum comprometimento metodológico na preparação do candidato. Os concursos têm procedimentos distintos — ainda que, atualmente, os da Magistratura tenham sido regulados de forma unitária pelo Conselho Nacional de Justiça — e os conteúdos programáticos são bastante diversificados, de acordo com o ramo de atividade relacionao ao concurso. A multiplicidade de opções, portanto, tende a deixar o candidato “perdido”, sem condições plenas de autoavaliação, o que é fundamental para seu sucesso.

Ainda que não seja imprescindível, acreditamos que o êxito do candidato passa pela definição de uma meta específicao tipo de carreira jurídica que gostaria de exercer — a partir do que pode traçar uma estratégia própria para o concurso que tem de prestar. Aqui, permitimo-nos um comentário adicional: o exercício de uma carreira jurídica tem forte apelo vocacional, de modo que o candidato deve considerar suas características pessoais para definir exatamente sua meta. Um juiz do trabalho, p. ex., tem de ter uma perspectiva muito peculiar, porque será responsável pela administração de um tipo de conflito social com características próprias, o que é muito diferente da perspectiva que tem o juiz de direito. Dessa maneira, quem não tem perfil adequado para exercer a magistratura trabalhista pode ter grandes dificuldades profissionais e até mesmo proferir decisões que, apesar de tecnicamente corretas, podem ser totalmente inconsonantes com os fundamentos do Direito do Trabalho.

De outro lado, apesar de instituições muito próximas, não se pode perder de foco a absoluta distinção que existe entre as atribuições do magistrado e do membro do Ministério Público, de maneira que o candidato deve alinhar seu conteúdo vocacional com as características de cada qual dessas funções, para definir o tipo de concurso que quer prestar.

Repetimos que não existe objeção alguma para que o candidato preste diversos concursos, para carreiras distintas, mas isso pode comprometer sua organização metodológica, para a qual a definição de uma meta é pressuposto essencial.

Nesse sentido, se o candidato fixou que deseja prestar o concurso da magistratura do trabalho (ou outros, além desse), deve, ao lado disso, estipular para si uma diretriz temporal que leve em conta uma preparação continuativa. Um hábito equivocado, mas que persegue muitos profissionais desde os bancos universitários, é o de estudar somente de acordo com a necessidade, ou seja, apenas imediatamente antes das provas. Por vezes, até de forma involuntária, esse hábito acaba sendo transportado para a preparação dos concursos públicos. Por isso, é importante deixarmos claro que isso raramente funciona. De nada adianta inscrever-se em um concurso e, somente depois disso, procurar um curso preparatório ou devorar um ou dois manuais de direito para obter sucesso no evento. Ressalvados casos de uma capacidade excepcional (e boa dose de sorte), esse procedimento tende a não dar qualquer resultado, pois a preparação para concursos é um processo continuativo, ou seja, deve existir de forma constante e regular e sem expectativa de que pruduza resultado imediato. Esse resultado pode até aparecer, mas será circunstancial, e não motivado pela preparação metodológica, esta sim, capaz de habilitar à produção de resultados planejados.

Dessa maneira, se o candidato definiu a carreira (ou carreiras) que pretende seguir, deve planejar todo o caminho que deve percorrer para alcançá-la. Primeiramente, deve saber exatamente como é realizado o concurso e, se possível, quais as expectativas de realização de provas nos próximos meses ou anos em cada tribunal. Em se tratando de concurso com diversas fases, deve avaliar cada uma delas, estudando os tipos de prova e as disciplinas exigidas, como pressuposto da elaboração de um plano de estudos, que envolva inclusive uma estimativa de tempo que ele considera como plausível para alcançar seu objetivo.

Isso não impede que o candidato comece a prestar concurso durante esse processo de preparação continuativa. No entanto, ele tem de considerar alguns aspectos importantes. Prestar um concurso é uma maneira interessante de se “experimentar” a sensação de ser um candidato, ainda que não esteja completada a preparação básica para tanto. Por outro lado, um concurso é sempre muito desgastante, pois envolve uma grande tensão do candidato e uma cobrança bastante intensa por parte de amigos e parentes do candidato. Além disso, prestar concurso em diversas regiões do país tem alto custo financeiro, não somente com o valor da inscrição, mas também com transporte e hospedagem — sem contar o dispêndio de tempo.

Por esses motivos, o candidato tem de refrear sua ansiedade e avaliar de modo muito preciso se vale a pena realmente prestar uma infinidade de concursos sem antes avaliar como está sua preparação, sobretudo porque eventuais insucessos representam frustrações que podem desanimar o candidato e prejudicar sua auto-estima.

O ideal, como já pontuamos, é fixar uma meta temporal, a partir da qual o candidato possa considerar que tem condições de enfrentar, se necessário, uma maratona de concursos. Isso é algo que não tem regra determinada, pois depende de cada pessoa e da própria disponibilidade de tempo de que possui para a preparação. Por isso, cada um tem que identificar nas suas condições pessoais os parâmetros que considera mais adequados, sendo, no entanto, fundamental:

— elaborar e realizar um plano de estudos, com metas a serem alcançadas
— realizar constantes autoavaliações para identificar o cumprimento dessas metas

No momento em que o estudante considerar que tem, pelo menos, uma estrutura básica de conhecimento, pode pensar em inscrever-se nos concursos públicos que se iniciarem. Demonstra-se, portanto, que a realização de provas em um concurso não se resume à inscrição e ao comparecimento no dia do exame, mas pressupõe todo um processo preparatório anterior, que tenha como foco que o conhecimento é um procedimento acumulativo, e somente quem tem uma base suficientemente forte tem condições de ser aprovado com tranquilidade. Caso contrário, o candidato está agindo como um “aventureiro”, e corre o risco de cercar-se de frustrações capazes de comprometer a sua própria afirmação intelectual.

Carlos Eduardo Oliveira Dias
Juiz do Trabalho. Mestre em Direito pela PUC-SP. Professor do Instituto Germinal

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O novo concurso da magistratura - Res. 75 do Conselho Nacional de Justiça

O concurso público para a magistratura do trabalho vinha sendo regulado pela Resolução Administrativa 907/2002, do Tribunal Superior do Trabalho, que nesses últimos sete anos recebeu algumas alterações de pouco valor substancial. Na essência, o concurso era dividido em cinco fases, sendo as quatro primeiras eliminatórias e a última (prova de títulos) de cunho classificatório. No entanto, em maio de 2009, o Conselho Nacional de Justiça aprovou a Resolução 75, disciplinando o novo formato dos concursos para todos os níveis e ramos da magistratura, o que, naturalmente, abrange também a Justiça do Trabalho.

Pelas novas diretrizes do CNJ, essa divisão em cinco etapas é mantida, mas com algumas alterações. A primeira continua a ser objetiva, com questões de múltipla escolha, mas envolvendo os três blocos previstos no Anexo II da Resolução. Os blocos são assim divididos: BLOCO UM (Direito Individual e Coletivo do Trabalho; Direito Administrativo; Direito Penal); BLOCO DOIS (Direito Processual do Trabalho; Direito Constitucional; Direito Civil; Direito da Criança e do Adolescente) e BLOCO TRÊS (Direito Processual Civil; Direito Internacional e Comunitário; Direito Previdenciário; Direito Empresarial). Nessa prova, a aprovação ocorrerá se o candidato obtiver o mínimo de 30% de acerto das questões em cada bloco e média final de 60% de acertos do total referente à soma algébrica das notas dos três blocos (art. 43). Outra novidade é que a Resolução autoriza que os Tribunais celebrem convênio ou contratem serviços de instituição especializada exclusivamente para a execução da primeira etapa do concurso, como ocorre nos certames para preenchimento de vagas de servidores.

A segunda etapa será composta de duas provas escritas, envolvendo o que antes chamávamos de segunda e terceira fases do concurso, ou seja, a prova dissertativa e a prova prática de sentença. Nessas provas é expressamente vedado o uso de súmulas e orientações jurisprudenciais, podendo apenas ser utilizada legislação sem qualquer comentário. Essas provas serão realizadas em dias distintos, preferencialmente em finais de semana, sendo primeiro aplicada a prova discursiva, que abrangerá questões de qualquer dos pontos do programa específico da Justiça do Trabalho – já indicados – e também de questões relativas a noções gerais de Direito e formação humanística previstas no Anexo VI da Resolução. Já a segunda prova consistirá na elaboração de uma sentença trabalhista, mas sua correção só será feita se o candidato for aprovado na prova discursiva.

A terceira etapa do concurso será iniciada pelo requerimento de inscrição definitiva do candidato aprovado nas duas etapas anteriores, mediante a apresentação dos documentos indicados no art. 58, par. 1º., da Resolução. Em seguida, o candidato deve submeter-se a exames médico e psicotécnico, por ele próprio custeados, os quais deverão resultar em laudos que serão encaminhados à Comissão de Concurso. Reunidos esses documentos, o presidente da Comissão de Concurso encaminhará ao órgão competente do tribunal os documentos mencionados no § 1º do art. 58, com exceção dos títulos, a fim de que se proceda à sindicância da vida pregressa e investigação social dos candidatos que poderá, inclusive, ordenar ou repetir diligências sobre a vida pregressa, investigação social, exames de saúde e psicotécnico, bem como convocar o candidato para submeter-se a exames complementares (arts. 61 e 62 da Resolução). Uma vez superada essa etapa, o presidente da Comissão de Concurso fará publicar edital com a relação dos candidatos cuja inscrição definitiva haja sido deferida, ao tempo em que os convocará para realização do sorteio dos pontos para prova oral bem como para realização das arguições.

Inicia-se, assim, a quarta etapa, representada pela prova oral, cuja sistemática é praticamente a mesma hoje vigente. Apenas ampliou-se o leque de matérias exigidas na prova, que passam a ser todas as também demandadas na segunda etapa. Da mesma forma, e a exemplo do que ocorrerá com as provas das etapas antecedentes, a média mínima para aprovação será seis. A quinta etapa também tem finalidade meramente classificatória, e corresponde à prova de títulos, exatamente como hoje vigora. A diferença substancial é que o art. 67 da Resolução explicita quais são os títulos admitidos e a respectiva pontuação de cada um, critério que deverá ser observado pelas Comissões de Concurso.

Diante de algumas incompatibilidades entre a Resolução Administrativa 907/2002, do TST e a Resolução 75 do CNJ, espera-se que a Corte Superior Trabalhista venha, em breve, realizar as devidas adequações, inclusive descrevendo o conteúdo programático de cada fase, com as respectivas disciplinas, sobretudo as que foram acrescidas pelo CNJ.

Da Equipe do Instituto Germinal

domingo, 13 de setembro de 2009

A nova competência material trabalhista e competência territorial

O critério de definição da competência territorial da Justiça do Trabalho sempre foi conduzido no sentido estabelecido pelo art. 651, da CLT, cuja regra geral era a da sua fixação pelo local da prestação de serviços do empregado. Não teria relevância, nesse caso, o local da contratação ou do domicílio do empregado ou do empregador, também não havendo nenhuma interferência nesse critério quem estaria a ocupar o pólo ativo ou passivo da ação. As exceções são aquelas inscritas nos parágrafos do mesmo artigo e, no seu conjunto, essas diretrizes atendiam adequadamente às necessidades derivadas dos conflitos trabalhistas, fundados no limite subjetivo que a competência constitucional lhe atribuía.
A Emenda Constitucional no. 45, de 2004, retirou a relevância desse critério - que focava a competência trabalhista sobre os conflitos entre trabalhadores e seus empregadores -, estabelecendo que a Justiça do Trabalho passaria a ser competente para julgar todo e qualquer litígio que derivasse das relações jurídicas descritas nos incisos do art. 114, da CF, não importando quem estivesse ocupando os pólos do conflito. Sem nos envolvermos no intenso debate sobre o alcance dessa nova modalidade de competência, o certo é que a diversidade de situações que derivam do novo quadro repercute diretamente na questão relacionada aos já assentados critérios de competência territorial.
Partindo-se da regra prevista na CLT, não temos dúvidas de que, sempre que o conflito sujeito à apreciação da Justiça do Trabalho - mesmo que não seja tipicamente trabalhista - envolver alguma modalidade de prestação de serviços, a regra consolidada tem plena incidência. Afinal, seus pressupostos fundamentais são a facilitação do acesso ao Judiciário, por qualquer das partes envolvidas na relação jurídica e o favorecimento à instrução probatória, ampliando as possibilidades da sua efetivação, quando tratado o conflito na localidade onde ele se verificou. Dessa maneira, se um trabalhador autônomo postula, na Justiça do Trabalho, a satisfação de certa parcela de seu contrato com um prestador de serviços, ainda que não se cogite, em seu caso, de relação de emprego, temos como pertinente a conclusão de que o foro competente para a apreciação desse conflito é o do local da prestação de serviços, salvo se a hipótese comportar alguma das exceções dos parágrafos do art. 651, da CLT.
O problema, de fato, surge em outras situações de competência trabalhista, nas quais não existe a figura da prestação de serviços. Tomemos um caso de disputa entre duas entidades sindicais por uma mesma base territorial: nessa situação, o critério do art. 651, da CLT não traduz uma regra passível de aplicação para solução da competência territorial, nada obstante a competência material seja da Justiça do Trabalho, nos termos do inciso III, do art. 114, da Constituição. Como definir, portanto, o juízo territorialmente competente em ações dessa natureza? No momento em que se discute e rediscute o uso subsidiário do processo comum ao processo do trabalho, não nos parece inadequado pensarmos que a competência, neste caso, será estabelecida pelo foro do domicílio do réu, pela aplicação supletiva do art. 94, do Código de Processo Civil. No caso, embora não seja omissa a CLT, sua regra objetiva a respeito do assunto não é suficiente para dirimir uma questão procedimental de grande importância como essa. Portanto, vemos aqui uma das plenas possibilidades de se realizar uma interpretação integrativa das normas processuais, ajustando-se aqueles que melhor atendem as necessidades do processo, voltadas fundamentalmente para a consagração da efetividade processual.
No entanto, essa solução não deve prevalecer para todas as demais hipóteses de competência trabalhista. Um exemplo disso está na competência territorial para apreciação do mandado de segurança, o que materialmente está estipulado no inciso IV do art. 114, da CF. A rigor, a competência para esse tipo de ação é tida como funcional, quer dizer, é definida pela categoria da autoridade coatora, o que inclusive estabelecer o Juízo funcionalmente competente. Nesse sentido, p.ex., se o ato atacado pela via mandamental foi produzido por Juiz de Vara do Trabalho, a competência funcional é do TRT; se foi ato de Desembargador do TRT, será o próprio TRT o órgão competente para cognição originária. Ao lado disso, a regra territorial de atribuição de competência se estabelece a partir da sede da autoridade coatora, tanto pela regra geral processual  - a já citada, de que a ação deve ser movida junto ao domicílio do réu - como pela ausência de determinação específica na Lei nº. 1.533/51. Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou, p.ex., no Conflito de Ccompetência 18.894-RN, rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro e no Conflito de Competência 50.794-DF, rel. Min. José Delgado, em ambos os casos assinalando que a competência territorial sempre será a sede da autoridade coatora.
Porém, vemos que essa solução nem sempre é adequada ao processo do trabalho. Por certo, em se tratando de mandado de segurança contra ato judicial, a questão ficará dirimida pela própria sede territorial de atuação do juiz que praticou o ato atacado. Preocupa-nos, no entanto, os atos praticados pela fiscalização do trabalho, cuja apreciação também é de competência trabalhista, ante o disposto no inc. VII, do art. 114, da CF. Nessa situação, e pela jurisprudência uniforme, a competência seria do foro da sede da autoridade coatora - vale dizer, da Subdelegacia ou da Delegacia Regional do Trabalho respectiva. No entanto, as áreas territoriais de atuação das Delegacias ou Subdelegacias nem sempre coincidem com os limites territoriais de atuação jurisdicional, podendo ocorrer de um determinado ato emanar de autoridade trabalhista com sede em uma dada cidade, cujo juiz do trabalho não tem jurisdição sobre a cidade em que é sediada a empresa que fora atingida por esse ato. No caso, pela interpretação sob análise, eventual mandado de segurança teria de ser impetrado na localidade da sede da autoridade, e não na sede da impetrante, cuja atuação, enquanto empregadora, estaria sob a jurisdição de outro magistrado trabalhista.
Para casos como esses, não vemos como utilizar-se da regra geral, porquanto será produzido um resultado totalmente inadequado. Por primeiro, essa estipulação poderia ser um grave obstáculo ao direito fundamental de acesso à Justiça, o que já o condena à inaplicabilidade. Mas, se isso não bastasse, há outros problemas estruturais que a situação hipoteticamente descrita permite. Imaginemos que tenha havido a autuação da empregadora por suposto desrespeito a normas de saúde e segurança no trabalho: eventual ação anulatória de multa teria de se proposta perante o Juízo trabalhista da sede da empregadora, mesmo órgão territorialmente competente para julgar eventuais reclamações trabalhistas de empregados daquela, que demandem temas também relacionados à saúde e segurança (como pleitos de adicionais de risco ou indenizações por acidentes de trabalho). Ora, sendo assim, parece totalmente inviável admitir-se que outro juiz julgue o mandado de segurança que verse sobre matéria correlata a essas, tão-somente a partir de um critério territorial que, inclusive, estabelece uma forma relativa de competência, o que prejudicaria sobremaneira o princípio da unidade da convicção - aquele que determina que, sempre que possível, devem ser concentradas no mesmo Juízo a apreciação de certas matérias correlatas.  
Em face desses fundamentos, temos que, em se tratando de mandado de segurança na Justiça do Trabalho, especialmente aqueles cujo objeto sejam os atos da fiscalização do trabalho, a competência territorial deve ser estabelecida pela localidade onde ocorreram os fatos ensejadores do mandamus, e não a sede da autoridade coatora. Registra-se que, o fato de ser uma modalidade relativa de competência, essa modificação derivada da interpretação não resulta em nenhuma nulidade, visto que tal competência pode ser prorrogada. De outro lado, essa interpretação não resulta nenhum prejuízo à autoridade coatora, visto que sua atuação no processo é meramente a de prestar informações, o que pode fazer por simples ofício, sem necessidade de prática de nenhum outro ato real ou pessoal no processo. Por fim, caso o ato ensejador do mandado de segurança abranja cidades que envolvam a jurisdição de mais de uma Vara do Trabalho, nesse caso existirá a competência concorrente, podendo ser impetrado em qualquer delas. 

Da equipe do Instituto Germinal

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Formas de estudo para concursos públicos: vale a pena fazer um curso preparatório?

Uma das primeiras dúvidas que atinge os interessados em prestar um concurso público, especialmente para as carreiras jurídicas mais tradicionais (Magistratura e Ministério Público), diz respeito à necessidade ou não de se freqüentar cursos preparatórios. 

Não há uma resposta única para essa indagação, pois a questão envolve, antes de tudo, as características de cada candidato. O estudo auto didático, como se sabe, exige um amplo grau de disciplina por parte do estudante, pois é muito difícil que ele consiga realizar a contento tudo aquilo que é essencial para alcançar seu objetivo, ainda mais se estiver envolvido em suas atividades profissionais.

Por isso, não devem contar apenas com estudos próprios aqueles que vivem assoberbados com a falta de tempo, ou que não possuem local próprio para estudar. Da mesma forma, os que não conseguem organizar seu tempo, ou que vivem relegando compromissos para outros dias ou horários. O autodidata tem que seguir uma disciplina rígida, capaz de envolvê-lo por completo, qualquer que seja a circunstância — deve ser capaz de abdicar de programas sociais que surgem naqueles períodos que estipulou para dedicar-se aos estudos, o que nem sempre é fácil, especialmente quando o estudante tem seus naturais compromissos familiares (cônjuge, filhos, namorado ou namorada). 

De outra parte, muitos procuram cursos preparatórios ainda quando estão na faculdade, cursando o penúltimo ou último ano da graduação, em uma busca ansiosa pelo ganho de tempo, como se isso fosse mais importante do que a aquisição do conhecimento. Investem seu dinheiro e sua energia acreditando que somente isso será suficiente para garantir sua aprovação, o que longe está de ser verdadeiro. Mais do que isso: não se lembram que o sucesso no concurso depende, em primeiro lugar, do próprio candidato, eis que, por mais competentes que sejam os professores, não serão eles que realizarão as provas. 

Acreditamos que o melhor caminho é aquele intermediário — a mescla adequada de frequência a cursos preparatórios com estudos complementares por conta própria. Nesse caso, o estudo feito pelo candidato não precisa seguir a rigidez que se encontra em um autodidata exclusivo, a despeito de serem necessários alguns procedimentos técnicos fundamentais. Esse estudo complementar deve servir para subsidiar os pontos mais complexos dos temas tratados em aulas, capacitando o estudante a levar para a sala as dúvidas que encontrou, a fim de dissecá-las com os colegas e com o professor. Além disso, deve o candidato aprofundar determinados pontos tratados com superficialidade no programa do curso,  eis que, por maior que seja sua carga horária, não há possibilidade de tratar de todas as variáveis de todos os assuntos relevantes.

A realização de cursos preparatórios, portanto, é uma prática absolutamente válida, sobretudo como forma de condicionar o candidato que não tem condições de ser um autodidata exclusivo — o que é o caso da maioria das pessoas — a estudar de forma sistemática. Sem sobras de dúvida, nos cursos que contam com bons professores, o aluno tem a oportunidade de consagrar seu aprendizado por intermédio de operadores qualificados do direito. 

OUTRAS VANTAGENS DOS CURSOS PREPARATÓRIOS 

— O candidato tem contato com outros candidatos, ampliando as possibilidades de debate sobre os temas estudados em sala de aula e em grupos de estudo; 
— Cria-se uma “rede” de informações sobre atualizações jurisprudenciais e legislativas e até mesmo sobre concursos em andamento, incentivando-se reciprocamente todos os seus integrantes;
— O candidato tem uma rotina a seguir, pois as aulas têm dias e horários determinados; 
— O professor é um referencial importante não só no ensino que ministra, mas nas orientações que transmite em suas aulas; 
— Boa parte dos cursos preparatórios possui uma estrutura de apoio muito importante, como bibliotecas de livre consulta aos alunos, site com informações de interesse de candidatos e até mesmo suporte para os que prestam concurso fora de sua cidade de origem. 

Todavia, assim como temos acompanhado a disseminação de faculdades de direito, nem sempre com qualidade suficiente sequer para conferir formação básica aos estudantes, também existe um número cada vez maior de cursos preparatórios que exigem atenção redobrada do candidato interessado em se matricular em algum deles. Em nossa opinião, antes de se frequentar algum curso, o candidato deve analisar alguns fatores importantes, como, por exemplo: 

— Procure saber os objetivos de cada curso oferecido, e verifique se existe algum que se encaixa em seus próprios objetivos; 

— Avalie cuidadosamente o programa oferecido e a carga horária estipulada; 

— Procure identificar os professores e tomar conhecimento de suas qualificações profissionais; 

— Verifique as condições estruturais do curso (salas de aula, recursos audiovisuais, biblioteca, sala de estudos) e as vantagens oferecidas aos alunos (políticas de convênios, utilização da biblioteca); 

— Obtenha referências de ex-alunos para saber do cumprimento das metas e programas dos cursos; 

— Dê preferência a cursos que permitam que o candidato assista a uma aula sem qualquer compromisso, na qual poderá ser avaliada a qualidade da turma e do professor; 

— Indague sobre o número de alunos por turma, vez que uma quantidade excessiva de pessoas na sala de aula prejudica a qualidade do aprendizado; 

— Dê preferência aos cursos que apresentem propostas de trabalho detalhadas e objetivas; 

— Exija contrato escrito com cláusulas assecuratórias dos direitos recíprocos da relação jurídica que se forma (prestação de serviços educacionais). 

Ao lado disso, não podemos deixar de fazer algumas advertências importantes para os que procuram cursos preparatórios: 

— Não confie em cursos que “garantem” aprovação em concursos, porque a aprovação é uma circunstância que depende de inúmeros fatores, totalmente à margem do controle dos cursos; 

— Evite matricular-se em cursos que não contem com uma estrutura adequada, como salas confortáveis e bem iluminadas; 

— Desconfie de cursos com cargas horárias reduzidas ou cursos muito concentrados eis que, salvo em casos excepcionais, não apresentam conteúdo suficiente para superação de fases do concurso; 

— Evite frequentar cursos com turmas muito grandes; 

— Não confie de forma absoluta nos divulgados “índices de aprovação”, pois muitos candidatos já frequentaram diversos cursos quando são aprovados, e não é possível especificar qual deles foi o “responsável” pelo sucesso; não é incomum encontrar-se um mesmo candidato louvado como tendo sido aprovado por dois cursos diferentes, na condição de “ex-aluno”; 

— Não acredite que o curso será o único responsável pela sua aprovação — alguns cursos querem tornar-se “babás” de candidatos, como se isso fosse suficiente para obtenção do resultado, desconsiderando que o importante é o processo de aprendizado; 

— Não existe “método infalível” de aprovação — fuja dos cursos que asseguram ter descoberto esses métodos; 

— Muitos cursos têm vendido “cursos on-line” que se resumem a remessa de apostilas ou textos por correio eletrônico, para que os candidatos estudem sozinhos — isso não é diferente de estudar autodidaticamente, portanto, a proposta é enganosa; os cursos virtuais verdadeiros são aqueles em que há um contato direto do aluno com o professor, ainda que remotamente, como os que utilizam transmissão por via satélite, por streamming ou salas de bate-papo na Internet, e com possibilidade de troca interativa de informações. 

— Curso apostilado pode ser um engodo: o professor pode se limitar a tratar do “universo” constante da apostila, o que é absolutamente restrito e insuficiente; 

— Não confie nos modismos: candidatos contumazes costumam migrar de um curso para outro, à procura do “ideal”, o que faz com que determinados cursos sejam considerados “da moda”, sem que isso signifique sua eficiência. 

Postos tais comentários, relembramos que, uma vez matriculado em algum curso preparatório, o candidato não está desobrigado de estudar por conta própria. Ao contrário, esse estudo será fundamental para o sucesso de sua empreitada.

Carlos Eduardo Oliveira Dias
Juiz do Trabalho. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP
Professor do Instituto Germinal

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

TST declara incompetência da Justiça do Trabalho para cobrança de honorários advocatícios

No julgamento do processo E-RR-310/2006-026-12-00.3, a  Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho declarou a incompetência da Justiça do Trabalhopara julgar ação de cobrança de honorários advocatícios estabelecidos entre duas pessoas físicas. Com esse entendimento, o TST trilhou o mesmo caminho do Superior Tribunal de Justiça, que já tinha estabelecido, em sua Súmula 363, a competência da Justiça Comum para apreciação de ações de cobrança entre profissional liberal e seu cliente. Esse é mais um capítulo envolvendo a controvérsia na interpretação do inciso I do art. 114, da Constituição, que trouxe na expressão "relação de emprego" uma grande dificuldade conceitual, devido às múltiplas possibilidades de seu preenchimento.


É sabido que, desde a Emenda Constitucional 45/2004, são inúmeras as teses extraídas desse dispositivo. Tem-se, de um lado, os que sustentam uma postura restritiva na interpretação, limitando as hipóteses de competência trabalhista aos casos de típica relação de emprego, com, no máximo, algumas extensões justificadas por sua própria natureza, como o caso do pequeno empreiteiro, previsto no art. 652, III, da CLT. No outro extremo, estão os que abrangem nesse conceito a totalidade das relações jurídicas de trabalho, inclusive as que podem configuração relações de consumo como, p.ex., os contratos de transporte.


No meio desse embate, as duas cortes superiores já sinalizaram uma interpretação mais restritiva, afastando da competência trabalhista ações de cobrança de honorários de profissional liberal. Com isso, consagraram o entendimento para uma hipótese que, em tese, até poderia ter tratamento equivalente ao da relação de emprego, por se tratar de situação em que a prestação de serviços pode ser pessoal. No entanto, o elemento diferenciador, na perspectiva do TST, é que foi reconhecido que, no caso analisado, trata-se de relação de índole civil, e não de relação de trabalho.

Destaca-se, ainda, na decisão do TST, o voto do Ministro Luiz Phillipe Vieira de Melo, que apontou precisamente os elementos de relação de consumo e de prestação de serviço existentes num contrato de advocacia, que não permitiria sua apreciação pela Justiça do Trabalho. A propósito, disse que, “quando o advogado age com o cliente, seu trabalho não tem valor de troca, porque o advogado detém a arte, a técnica, e ainda cobra pelo serviço” (...) “Neste caso, o cliente é que é considerado hipossuficiente social no juizado cível e do consumidor, em detrimento da hipossuficiência econômica, que seria a do advogado. Essa condição é inconcebível no processo do trabalho”. Esse entendimento pode ser visto como um relevante indicativo de que a tendência do TST, por sua SDI-1 (que é o órgão máximo de uniformização jurisprudencial daquela Corte), é a de afastar por completo da competência laboral contratos que possam ser configurados como sendo relações de consumo.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Concurso para magistratura do trabalho e metodologia de estudos - considerações importantes

O ato de estudar está muito distante do procedimento que a maioria dos interessados em prestar um concurso adota. Não basta, para o desenvolvimento pleno e eficiente das etapas de um concurso público, que o candidato se debruce de forma alucinada sobre qualquer obra literária. Para ter condições essenciais de sucesso, é fundamental que o estudo e a preparação para o concurso se revistam de procedimentos metodológicos fundamentais em qualquer tipo de pesquisa científica. Sabemos que essa é outra grave deficiência do ensino jurídico contemporâneo que, justamente por priorizar o ensino dogmático, deixa de lado a essencialidade crítica dos processos de aprendizado — e, nesse contexto, relegam a metolodogia da pesquisa a um plano absolutamente secundário. Todavia, vemos com esperança o fato de que, com a exigibilidade de apresentação de monografia de final de curso nas faculdades de direito, ao menos em tese, a metodologia voltou a ter um lugar destacado nos bancos acadêmicos.

Cremos que, para alcançar seus objetivos, o candidato em qualquer tipo de concurso deve começar fazendo uma reflexão crítica sobre o ato de estudar. E, para tanto, nada melhor que relembrar um dos mais importantes educadores brasileiros — Paulo Freire, em um texto chamado “Considerações em Torno do Ato de Estudar”:
“Estudar, realmente, é um trabalho difícil. Exige, de quem a ele se propõe, uma posição crítica, sistemática. Exige uma disciplina intelectual que não se ganha a não ser praticando-a.”

O que critica o educador, nesse contexto, é o que ele chama de “educação bancária”, ou seja, a postura passiva do educando, a partir da qual restam dizimados sua curiosidade e seu espírito investigador. Com isso, ao invés do estudante tentar compreender o texto, seu único objetivo é o de memorizá-lo. Isso é absolutamente conveniente à manutenção daquele “pacto sinistro” ao qual nos referimos em capítulo anterior — o estudante pouco estimulado à crítica preocupa-se meramente em memorizar os conceitos que apreende e vira um reprodutor de “conhecimento”.

Paulo Freire nos conclama à insurgência contra esse pacto, apontando aquilo que considera como itens indispensáveis ao ato de estudar:
a) O estudante deve assumir o papel de sujeito do ato de estudar.
b) O ato de estudar é uma atitude frente ao mundo.
c) O estudo de um tema específico deve colocar o estudioso a par da bibliografia em questão.
d) O ato de estudar depende de uma atitude de humildade face ao saber.
e) O ato de estudar significa compreender e criticar.
f) Estudar significa assumir “uma misteriosa relação dialógica” com o autor do texto, cujo mediador é o tema.
g) O ato de estudar, como reflexão crítica, exige do sujeito uma reflexão sobre o próprio significado de estudar.(21)

Essas considerações devem, no entanto, ser devidamente contextualizadas. Como já apontamos, os concursos da magistratura do trabalho tendem a seguir um modelo dogmático clássico, e exigem do candidato muito mais pragmatismo do que postura crítica. Todavia, o candidato não precisa submeter-se ao processo de engessamento intelectual que as escolas de direito e meios jurídicos vêm impondo aos estudantes e estudiosos da Ciência Jurídica. Do contrário, se em seu processo de preparação souber compreender e criticar o objeto do estudo (como adverte Paulo Freire), além de superar com maior facilidade as fases do concurso, tende a ser um profissional mais qualificado no exercício de sua função judicante.

Daí por que insistimos na necessidade de que o processo de preparação do candidato seja cercado de procedimentos metodológicos, porque somente seguindo uma série de atividades preparatórias no seu estudo é que o candidato pode buscar e alcançar um aprofundamento interpretativo dos textos necessários para aquisição sólida de conhecimento.

Isso não significa que exista propriamente um “método” que assegure aprovação em qualquer concurso público. Isso é absolutamente falacioso, pois não existe qualquer sistema genérico, adaptável a todas as pessoas e que assegure resultado eficiente. O que defendemos é que se utilize, no processo de preparação para o concurso, dos procedimentos metodológicos de estudo científico, que não garantem outra coisa senão a apreensão estruturada de certos aspectos do conhecimento humano. Esse fator, como já apontamos, é que pode ser útil no momento da submissão ao concurso público, muito embora ele seja igualmente importante para a formação intelectual do candidato.

CARLOS EDUARDO OLIVEIRA DIAS
Juiz do Trabalho. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP. Professor do Instituto Germinal.